Imagine ser convidada para estrelar uma “publi” na internet e, em vez de exaltar as qualidades, você anunciar em alto e bom som que “nunca vai usar” o produto. E, mesmo assim, ganhar um bom cachê por isso.
Foi o que aconteceu com a cantora Maria Bethânia, 78, que estrela com Sabrina Sato, 44, a campanha de um produto antifrizz para os cabelos. No vídeo, disponibilizado nas redes sociais da marca TRESemmé, o modo “sincerão” da cantora foi o que fez sucesso.
Na campanha, Sabrina fala sobre as vantagens da loção, cuja função é deixar os fios mais alinhados. Mas Bethânia, conhecida pelas madeixas volumosas e naturais, recusa aplicá-la em seus cabelos e dá respostas bem-humoradas.
“Não use esse produto se não quiser. Do produto, não duvido, mas não vou usar, não. Eu não quero”, diz a cantora, antes de receber das mãos da colega o produto. “Nunca vou provar”, emenda a artista, aos risos.
Em determinado momento, Sabrina pergunta a ela: “Como a gente vai gravar nossa campanha, então?”. E ouve a resposta de Bethânia: “Com a verdade. Você com a sua e eu com a minha”.
A estratégia da marca de mostrar um bate-papo sincero entre as duas deu resultado. Cada um dos três vídeos publicados tem mais de 65 mil curtidas e milhares de comentários de gente famosa e anônima exaltando a cantora e sua espontaneidade.
ESTRATÉGIA OUSADA
Segundo o especialista em marketing digital Ângelo Vieira Jr., da Lúmen Strategy, a campanha é um ótimo exemplo de como, às vezes, a estratégia mais potente é justamente a que “nada contra a corrente”.
“Quando uma empresa tem coragem de colocar uma figura como a Bethânia dizendo que não vai usar o produto, ela está, na verdade, ampliando o alcance simbólico da marca”, explica.
Na visão dele, a “anticampanha” legitima o produto, pois “a relevância está mais em provocar conversa do que em buscar consenso”. “E isso exige ousadia. Fez o barulho certo”, avalia o estrategista.
Na visão de Rafael Terra, escritor e especialista em marketing digital, campanhas como essa servem para quebrar um padrão já esperado —e por isso funcionam. “Aquilo que foge do comum gera curiosidade, e curiosidade é a mãe da atenção”, afirma.
“É isso o que faz uma campanha virar pauta, post, meme e cultura. Porque o motor das redes sociais não é a venda, é a conversa.”
Na opinião de Mariana Munis, professora de marketing da Universidade Presbiteriana Mackenzie, o país está carente de maior autenticidade na comunicação e, por isso, a campanha com Bethânia e Sabrina foi tão acertada.
“Há o elemento surpresa de que ninguém imaginaria essas duas figuras icônicas se encontrando e batendo um papo sobre beleza”, avalia.
“Outra coisa que gostaria de exaltar é que a marca soube trabalhar fortemente em uma tendência: o envelhecimento da população”, lembra. “São duas mulheres acima de 40 anos que possuem características de autenticidade, falando sobre como seus cabelos são.”